Híbridos flex: por que a tecnologia está no centro dos R$ 117 bilhões de investimentos das montadoras




Anfavea compilou os valores da nova rodada de investimentos do mercado automotivo brasileiro. Chegada de montadoras chinesas fez a concorrência se mexer para fazer crescer uma tecnologia que combina eletrificação e motores flex. Carro é produzido em fábrica da Volkswagen.
Divulgação/Volkswagen
O mercado automotivo do país passa por um ciclo histórico de investimentos, que chegou a um montante de R$ 117 bilhões anunciados por montadoras que atuam por aqui. A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) compilou os números, depois dos anúncios desta semana de Toyota e Stellantis.
São investimentos ativos a partir de 2021, e que representam um recorde para o setor automotivo nacional. Só em 2024, foram anunciados R$ 66 bilhões pelas montadoras, para ampliação de produção e desenvolvimento de tecnologia no país.
Quase metade do valor deste ano corresponde à Stellantis, dona de marcas como Fiat e Jeep, que irá investir R$ 30 bilhões em suas fábricas no Brasil entre 2025 e 2030. Esse é também o maior valor já aplicado por uma única empresa na indústria automotiva brasileira.
Entre as prioridades, estão ao menos 40 novos produtos e o desenvolvimento tecnologias de descarbonização de veículos, em especial a chamada tecnologia bio-hybrid — modelo que combina a eletrificação com motores flex movidos a etanol.
O nome “diferentão” nada mais é que o híbrido flex, uma inovação de origem brasileira — encampada primeiro pela concorrente Toyota — e figurinha carimbada entre os anúncios recentes das montadoras.
Além do híbrido flex da Stellantis, há os seguintes planos no radar:
A BYD, especializada em elétricos, anunciou um centro de pesquisa para desenvolver um motor híbrido flex na Bahia.
A Toyota também faz parte da rodada de investimentos com R$ 11 bilhões, e pretende consolidar a tecnologia de híbridos flex como forma de “manter seu protagonismo e liderança no país em eletrificação e exportações”.
A Volkswagen fala em usar parte dos R$ 16 bilhões em um novo motor para veículos híbridos (sem especificar se será flex), 100% elétricos e total flex — além de uma plataforma “inovadora, tecnológica, flexível e sustentável”.
A GM diz que parte de seus R$ 7 bilhões servirão para uma reformulação completa do portfólio, deixando no ar que os modelos estarão “em sintonia com a matriz energética predominantemente limpa do país”.
O g1 já mostrou que, além dos preços mais elevados e da complexidade tecnológica, a migração para carros 100% elétricos ainda não é tratada como prioridade no país. Os carros híbridos acabam sendo mais vantajosos no Brasil porque têm preços mais competitivos, e aqueles que usam etanol desfrutam de combustível que emite menos gás carbônico e é abundante no país.
“O importante é mencionar que — considerando todo o CO2 produzido por um carro durante sua produção, utilização e descarte — um veículo híbrido, quando operando com etanol no Brasil, é provavelmente o veículo mais limpo do planeta produzido em massa”, afirmou o professor Renato Romio, gerente da Divisão de Motores e Veículos do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT).
Veja, no fim desta reportagem, mais detalhes sobre os aportes das empresas.
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Mas o que justifica os investimentos — e o foco nos híbridos?
Para o diretor de desenvolvimento de negócios da JATO do Brasil, Milad Kalume Neto, essa onda otimista — aliada à corrida pelo desenvolvimento dos híbridos flex — tem alguns motivos principais:
o país está em processo de estabilidade econômica;
as montadoras chinesas pressionaram o mercado brasileiro;
e os novos programas do governo federal têm impulsionado o setor.
O especialista explica que as empresas estão enxergando o país com mais confiança diante de um ambiente de fortalecimento da economia e de um “panorama muito melhor para o segundo semestre”.
Também tem colaborado para o cenário o fato de o setor estar, em nível global, direcionado para o desenvolvimento de veículos híbridos, flex e elétricos, explica Milad.
Com a indústria brasileira atrasada nesse tipo de investimento, as montadoras chinesas — já desenvolvidas nesse sentido — passaram, portanto, a pressionar fortemente o mercado interno, colaborando com essa nova corrida dentro do setor.
“De repente, a indústria teve a necessidade de montar produtos para competir não só no mercado interno — que, agora, conta com a tecnologia trazida pelos chineses a um preço competitivo —, mas também em outros mercados”, observa Milad.
Ele ressalta ainda o papel do programa Nova Indústria Brasil, que irá disponibilizar R$ 300 bilhões em financiamentos para a indústria até 2026, e do programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), voltado a veículos sustentáveis e à produção de novas tecnologias, ambos do governo federal.
Nesse sentido, a Anfavea também afirmou que “medidas anunciadas pelo poder público” tem proporcionado “previsibilidade às empresas”, o que colabora para os “valores recordes” de investimentos no setor automotivo.
“[Há ainda] a queda na taxa de juros, que nós esperamos que seja consistente ao longo do ano. Esse quadro de otimismo no setor certamente levará, até o final do ano, a mais investimentos”, afirmou o diretor-executivo da Anfavea, Igor Calvet, em coletiva de imprensa nesta quinta-feira.
Na esteira dos novos investimentos, Milad, da JATO do Brasil, acredita que “agora, portanto, teremos dinheiro para o desenvolvimento de novas tecnologias”, com fatores “convergindo para que o país tenha um grande potencial de crescimento do setor”.
“Então, esse é o momento em que o Brasil se encaixa: necessidade da nossa indústria, visão global voltada para motores híbridos ou elétricos e a questão da economia interna”, conclui.
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O que dizem as empresas
BYD
A chinesa BYD destacou que, entre os valores investidos pela empresa no Brasil, estão R$ 6 milhões destinados a um novo laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) localizado em Campinas (SP), que foi inaugurado em dezembro de 2023.
A empresa também informou que irá investir na criação de um Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico na Bahia, para desenvolver, entre outros projetos, tecnologia de um motor híbrido-flex, para combinar o etanol com o motor elétrico.
GM
A General Motors (GM) anunciou um investimento de R$ 7 bilhões no Brasil até 2028. Segundo a montadora, os investimentos começam a partir deste ano.
A montadora destacou que o investimento tem foco em mobilidade sustentável, abrange a renovação completa do portfólio de veículos e o desenvolvimento de tecnologias para o mercado local, além de criação de novos negócios.
“A companhia segue com sua visão de futuro, de um mundo com zero acidente, zero emissão e zero congestionamento. Esta estratégia engloba recursos avançados de segurança veicular e de produtos cada vez mais eficientes do ponto de vista energético e ambiental”, diz a companhia em nota.
Stellantis
A montadora informou que suas três fábricas no Brasil (MG, PE e RJ) serão beneficiadas pelos investimentos anunciados. Serão 40 novos produtos, quatro plataformas globais associadas às tecnologias bio-hybrid, 8 powertrains e novas tecnologias ligadas à segurança e eletrificação.
Em resposta ao g1, a Stellantis disse ter estabelecido o objetivo de descarbonizar totalmente suas operações até 2038, com redução das emissões pela metade já em 2030, sendo “45% da redução relacionada a ações e tecnologias no produto”.
Nesse sentido, a empresa destaca a combinação do etanol com a eletrificação (carro híbrido) como “alternativa competitiva de transição para a difusão da eletrificação a preços acessíveis”.
Sobre os investimentos bilionários anunciados, a Stellantis afirmou ser “uma resposta ao ambiente de negócios favorável que encontramos no país” e que o Brasil “assumirá um papel de liderança na aceleração da descarbonização da mobilidade”.
Toyota
Ao g1, a Toyota diz acreditar que a melhor tecnologia em eletrificação seja aquela que se encaixa perfeitamente na infraestrutura existente em seus diversos mercados de atuação, sem deixar de considerar a matriz energética do país como ponto crucial para a virada de chave da indústria em busca da efetiva descarbonização.
“Após a consolidação do híbrido flex, a companhia defende que a inclusão de outras tecnologias também contribui com o processo de eletrificação de seu portfólio no Brasil e na região. E, no mercado brasileiro, o etanol é parte fundamental para que a eletrificação avance, de fato, com ganhos reais em baixas emissões de CO2, considerando que a infraestrutura existe e sem impactar os hábitos de uso dos consumidores”, diz a empresa.
Sobre o estágio de seus veículos híbridos flex, a empresa informa que, em setembro do ano passado, iniciou testes internos utilizando etanol em conjunto com a tecnologia híbrida plug-in e que, neste primeiro estágio, os estudos se mostraram “promissores”.
Ainda em 2023, a Toyota também anunciou a participação no projeto de pesquisa e desenvolvimento para avaliar a utilização de hidrogênio a partir do etanol em carros de passageiros junto com Shell, Raízen, Hytron, Senai e USP.
Volkswagen
A Volkswagen informou que, na primeira fase de seus investimentos, pretende desenvolver e produzir quatro veículos inéditos, sendo que um deles será uma pick-up.
Além dos veículos, a montadora anunciou que desenvolverá, através do investimento, um novo motor para veículos híbridos e uma plataforma “inovadora, tecnológica, flexível e sustentável”.
Na mesma linha das outras empresas, a Volks destacou que os novos modelos, inéditos em seu portfólio, serão “fundamentais para impulsionar ainda mais a estratégia de descarbonização da marca na região da América do Sul”.
Em entrevista ao g1, o CEO da montadora, Ciro Possobom, chegou a destacar o início da produção de híbridos pela Volks como uma das principais novidades de seu novo ciclo de investimentos no Brasil.
“A Volkswagen é hoje a terceira maior fabricante de carros elétricos do mundo. Então, temos uma gama enorme de carros e vamos escolher os modelos mais adequados para produção no país”, afirmou o executivo.




Fonte: G1

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